DALTON TREVISAN




Solta do pessegueiro a folha seca volteia sem cair no chão - um pardal.

* * *

- Na cama o João vem pra cima de mim. Uma transa lá entre ele e minha perna, não estou nem aí.

* * *

Excitação maior que despi-la? É livrá-la do óculo. Mais nua de estar sem óculo que sem roupa.

* * *

A besta do Apocalipse, quem diria, reduzida a cobrar o dízimo dos fiéis.

* * *

Era um homem trôpego, calça branca, sem camisa, a faca enterrada no peito e sangrando.

- Ai, o que você fez?

- É segredo meu. Não tem nada com isso.

- Por você esfrego olho de vaga-lume nas unhas...

- Credo, meu bem.

- ... que acendem no escuro o teu nome.

* * *

No gesto mágico, duas vezes nua. João se contém para, de mão posta, não cair de joelho. Quem viu uma mulher nua já viu todas? Aí se engana, cada uma é todinha diferente. Ah, que bom, aprender tudo outra vez.

* * *

A bruxa em trapos, banguela e bêbada, num sorriso para o bicho barbudo de saco nas costas:

- Amor, tem um cigarro aí?

* * *

Bolem na vidraça uns dedos tiritantes de frio - a chuva.

* * * 

A chuva sovina conta e reconta suas moedas nas latas do quintal.

* * *

A velhinha meio cega, trêmula e desdentada:

- Assim que ele morra eu começo a viver.


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Microcontos do livro Ah, é?




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